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20.1.16

o outro lado da moeda

antes de começar a escrever este post tenho de contar uma outra história. 
escrevi estas palavras em Sea Point no La Vie Cafe & Bar, um espaço com esplanada com vista para o mar. pelo ambiente, o preço e outros itens que identifiquei, arrisco que o lugar seja para classe média/alta, onde, com excepção da maioria dos funcionários que servem as mesas, sou o único negro. entram 3 mulheres e pedem para ir a casa de banho, depois uma regressa e senta-se na mesa de alguém e bem na minha frente aparentemente com discrição de quem já faz isso algumas vezes, tira a carteira de uma menina e põe-se em fuga... eu e mais 2 pessoas ainda saímos atrás dela mas a rapariga sumiu na esquina seguinte! felizmente a carteira reapareceu graças as amigas que foram pressionadas pelo gerente do bar. 

a história para dizer que durante todo tempo que caminhei por Woodstock várias pessoas advertiram-me para ter cuidado com a maquina fotográfica porque poderia ser assaltado, ao contrario de Sea Point onde nunca ninguém me disse nada! 

agora, o assunto desse post. 
sempre acreditei que o presente de um povo dificilmente se desliga do seu passado. a Africa do Sul viveu anos e anos um sistema de apartheid, e apesar do mesmo já ter terminado a 21 anos atrás, no dia a dia de uma cidade como Cape Town é muito difícil para um negro não se deparar com fragmentos bem presentes desse sistema. por incrível que pareça, os próprios negros por força de anos de limitação, também eles ainda hoje alimentam de forma invisível este sistema. só assim consigo explicar que um policia insiste em indicar-me a paragem de táxis colectivos, quando várias vezes dizia que queria um táxi normal (quase a fazer o desenho de um taxímetro!). no supermercado a maioria dos funcionários quase que não encaram nos olhos os clientes brancos... mas também, há que dizer que não é fácil estar 19 minutos numa loja da Apple onde os funcionários apenas vão ter supostamente com clientes brancos questionando you need help, mesmo observando que está ali uma pessoa a muito mais tempo e ninguém pergunta se precisa de help! não é uma experiencia muito agradável, posso garantir. 

para os negros sul africanos talvez a mensagem do fim do apartheid foi mal transmitida. penso que faltou dizer-lhes bem explícito que uma coisa é o fim de um sistema racista e outra coisa é dizer que à partir desse momento terão acesso ao mesmo nível de vida que os brancos, o que significa ter o mesmo nível financeiro... coisa que não acontece do dia para noite nem em 21 anos de pátria arco-íris. como estrangeiro, é-me difícil julgar, ainda mais quando estive em lugares onde vivem pessoas relativamente pobres mas com acesso a bens que em Angola nem muitos ricos têm.