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18.2.16

fragmentação num espaço novo

como em muito segmentos da nossa sociedade, também a arte sofre de muitos problemas causados pela situação do país... não me refiro a crise actual mas sim a um conjunto de investimentos que foram feitos ao longo dos anos com prioridades erradas. 

entretanto, a par disso há também o factor humano que tem a sua cota de responsabilidade na forma como o país caminha. há um sentimento espalhado pela sociedade angolana que as “riquezas” naturais que supostamente o país tem substituem o trabalho e tudo se resolve porque somos ricos! infelizmente e como não deveria deixar de ser, esse cancro está também no meio artístico, sendo que no caso dos artistas ainda temos a falsa questão da inspiração que também piora as coisas. 

num país em que a cultura é considerada uma perca de tempo e dinheiro, é normal que os artistas se virem para sustentar as suas necessidades e o seu trabalho em si... mas a sua maioria se esquece que num mundo globalizado e misturado como o de hoje, a qualidade e a seriedade do seu trabalho trazem resultados de todos os cantos. é urgente que os artistas de cá se apercebam que trabalhar com arte exige a mesma disciplina, profissionalismos e por vezes até formação que qualquer outra profissão... como o advogado, o cozinheiro, o economista, um artista também precisa de investigar para dominar os matérias e as técnicas que pretende aplicar em determinada ideia... como o arquitecto ou o publicitário, um artista também precisa saber que hoje em dia não tem grande espaço de networking se a sua comunicação é feita apenas em português... como o jornalista ou até mesmo um pasteleiro de doces, um artista precisa mentalizar-se de uma vez por todas que aquela ideia de que as grandes ideias surgem do nada do vazio e em muitos casos do charro de liamba ou dos copos de whisky na madrugada fora é utopia dos filmes de hollywood... as grandes ideias surgem da disciplina de trabalho, da formação pessoal, de horas e horas de pesquisa, da humildade, da capacidade de se reinventar, mas também do facto de perceber que até aquele talento de nascença também precisa de ser alimentado e actualizado, caso contrario o panorama artístico jamais vai sair do momento actual de completa estagnação e enganação entre todos os intervenientes. o artista que se engana a si próprio que tem uma obra interessante, do curador (temos??) que engana o artista que a sua obra é excelente, do produtor que acredita na mentira do curador e do artista e consegue vender essa mentira aos patrocinadores, do jornalista que mesmo sem perceber nada também entra para a mentira e escreve sobre o assunto .. e por fim, o público que se alegra porque a mentira do artista é diferente de tudo aquilo que já viu, sendo que a diferença por cá muitas vezes entende-se como sinónimo de arte! 

no final, vivemos todos numa grande mentira. 

mas esse não é um texto sobre a mentira que se cria na arte angolana... esse é um texto sobre a fragmentação do trabalho de um artista angolano que possivelmente soube contornar a mentira procurando justamente alguns dos itens que são tão importantes para um advogado, um economista ou um jornalista. em angola, é raro encontramos um artista que saiba explicar o conceito do seu trabalho, os objectivos e muitas vezes as linhas de pensamento que o levaram para o caminho x ou y... e isso, é por si só um facto que separa aqueles que são água daqueles que são azeite, sendo que a mistura que muitas vezes se transmite aqui dentro não coincide em nada quando a água e o azeite vão lá para fora, porque na verdade a água consegue sair com convites internacionais enquanto que o azeite sai apenas com convites de determinados ministérios que sem legitimidade alguma decidem que aquelas obras representam alguma coisa incluindo a arte nacional. 

mas voltando ao assunto do texto que é sobre a exposição Fragmentação 1.0 de Januário Jano, num espaço novo com as suas qualidades e defeitos mas que seguramente é o único na cidade de Luanda que se deveria chamar galeria, a exposição tem também a novidade de sair da mentira que andamos sendo que terá 2 meses de duração, o que cria um grande desafio a Mov´art, produtora do evento, que terá de levar o publico ao espaço depois do dia do vinho e dos rissóis. Fragmentação 1.0 com pintura, instalação, site-specific e video abre hoje as 18h na galeria Banco Económico.

10.2.16

estagnado e eternamente da vitória!

estas imagens poderiam ter sido feitas no ano passado, em 2011 e possivelmente em 1999... porque esta é a realidade do nosso carnaval, uma manifestação de rua que precisa urgentemente de um grande investimento na criatividade ou corremos o risco de ver o mesmo enredo nos próximos 10 anos!
 

1.2.16

Baia, um espaço metamorfoseado

faz tempo que queria escrever sobre a Baia, um espaço que foi ocupado pelos interesses do monstro imobiliário mesmo que a mensagem divulgada seja diferente. 

antes de mais, quero dizer que não existe qualquer intenção de retirar o mérito ao projecto de requalificação da Baia, uma ideia que na verdade melhorou consideravelmente o lugar e levou o cidadão a rua, coisa praticamente inexistente na Luanda de hoje. a questão no meu entender está na forma em que o espaço tem sido gerido, com conceitos esquisitos e de difícil compreensão, sendo que como em diferentes partes do mundo, as praças, jardins ou espaços públicos tem como principal beneficiário o citadino. 

a requalificação da nossa Baia trouxe zonas pedonais, zonas de relaxe, zonas para prática de desporto, zonas de lazer familiar, mas me preocupa que trouxe também zonas de uso exclusivo para eventos que nada beneficiam o citadino. o casamento do fulano, a festa de branco da produtora x e até mesmo o evento de aniversário do banco b, são acontecimentos que aproveitaram-se de um espaço que nunca deveria ser usado para esse fim... mesmo que muitas opiniões digam que as coisas não são bem assim, a verdade é que a maioria das iniciativas que acontecem naquele espaço público, o acesso é quase sempre cobrado sem que os organizadores deem nada em troca ao cidadão. a gestão da Baia tem que perceber que o principal beneficiário daquele espaço é o cidadão e não o bolso de quem tem a ideia de usar um espaço público para arrecadar receitas. 

é preciso também que as grandes empresas locais percebam que as iniciativas de entretenimento sem qualquer custo para o citadino são um investimento e nunca uma perca... as grandes cidades usam o método como forma de compensar e até retribuir a massa trabalhadora que lá vive... Sons do Atlantico ou Baia Mágica são os únicos exemplos que me veem a mente de eventos que usam aquele espaço público com foco no cidadão. 

no sábado fui conhecer o novo conceito Shopping ao Ar Livre, uma ideia que não percebi de todo como será principalmente pelos preços praticados para quem quiser comer um hambúrguer ou beber simplesmente água! é verdade que ouvir música ao vivo, praticar salsa com as crianças ou ter alguém que desenhe caricaturas tudo isso grátis não é uma ideia normal em Luanda e estou feliz que assim seja... mas nunca percebi qual é ideia de criar um jardim público onde é proibido que uma família com filhos, um casal de namorados ou grupo de amigos possam sentar a relva e fazer um piquenique com um snack levado de casa. a manutenção de um espaço público é da responsabilidade das entidades públicas ou do privado que for escolhido para gerir o espaço, mas a proibição é injusta porque limita o cidadão no desfrute de um espaço que lhe "pertence". a quem levante a questão que muitas vezes são os próprios luandenses que danificam os espaços públicos por falta de formação e outros factores... os defensores dessa tese esquecem-se quase sempre que a cidadania não é um comportamento que se cria com leis, construção de espaços bonitos ou mensagens de desenvolvimento... a cidadania de um povo cria-se com investimento na educação que é base da resolução de muitos dos problemas que vivemos em Luanda, daí o questionamento das prioridades que muitas vezes criam episódios como os da relva da Baia. 

afinal, o que é prioritário no cronograma de investimentos que um país faz para o seu cidadão... a construção de um jardim que não se pode ter acesso por receio que seja destruído ou a construção de escolas de base para investirmos na educação daqueles que amanhã com certeza saberão usar um jardim público. 

por cá, continuamos a inventar conceitos esquisitos, muitas vezes porque não nos rodeamos da assessoria dos melhores e também porque copiamos mal aquilo que noutras paragens foi bem feito.

haverá um regresso

no final, era para ser apenas um post para agradecer Cape Town, esse lugar maravilhoso que conheci, tão próximo de Luanda e ao mesmo tempo muito longe de Luanda.